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Narrativas do Feminino

Fase 5 — 2024

Nas casas das cidades, nas fazendas e estâncias dos pagos rio-grandenses, nos comércios, nas quitandas, nos serviços mais essenciais à vida dos gaúchos, as mulheres negras sempre estiveram presentes. No século XX, foram elas as primeiras costureiras a abrir ateliers improvisados em suas casas e a empreender na venda de quitutes para os banquetes da elite.


Mas, para além dos trabalhos do cotidiano, estavam presentes também nos movimentos de luta, como nas reuniões da Sociedade Beneficente Floresta Aurora, entidade negra mais antiga do Brasil, fundada em Porto Alegre, em 1872.
Hoje, estão presentes e são vanguarda nas mais diversas esferas sociais e culturais: são pesquisadoras, intelectuais, mestras griôs, artistas, educadoras, pensadoras e ativistas. Mas também continuam sendo a grande maioria de trabalhadoras mal remuneradas, mães solo e vítimas de violência doméstica, o que nos mostra o quanto ainda é preciso avançar na luta por uma sociedade mais justa e igualitária.

ANCIÃS DONAS DA HISTÓRIA

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Amancia, Sem data. 
Tratamento digital, Álvaro Bonadiman, 2021

Acervo MHJC

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Maria Ignácia, Sem data. 
Tratamento digital, Álvaro Bonadiman, 2021
Acervo MHJC

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Mãe Preta, Sem data. 
Tratamento digital, Álvaro Bonadiman, 2021
Acervo MHJC

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Mãe Rita Ialorixá, Sem data. 
Tratamento digital, Álvaro Bonadiman, 2021
Acervo MHJC

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Vereadora Teresa Franco,
Sem data. 

Tratamento digital, Álvaro Bonadiman, 2021

Acervo MHJC

Rainha Ginga Severina Maria Francisca Dias, a “Sibirina” .jpg

Rainha Ginga Severina Maria Francisca Dias, Sem data. 
Tratamento digital, Álvaro Bonadiman, 2021
Acervo MHJC

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Tia Forosa.
Sem data e sem autor.
Acervo MHJC

ÀS QUE VIERAM ANTES

Vozes-Mulheres


A voz de minha bisavó
ecoou criança
nos porões do navio.
Ecoou lamentos
de uma infância perdida.
A voz de minha avó
ecoou obediência
aos brancos-donos de tudo.

A voz de minha mãe
ecoou baixinho revolta
no fundo das cozinhas alheias
debaixo das trouxas
roupagens sujas dos brancos
pelo caminho empoeirado
rumo à favela.
A minha voz ainda
ecoa versos perplexos
com rimas de sangue
e
fome.
A voz de minha filha
recolhe todas as nossas vozes
recolhe em si
as vozes mudas caladas
engasgadas nas gargantas.
A voz de minha filha
recolhe em si
a fala e o ato.
O ontem – o hoje – o agora.
Na voz de minha filha
se fará ouvir a ressonância
o eco da vida-liberdade.

Conceição Evaristo

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No ano 2021, foi inaugurada no Palácio Piratini a exposição fotográfica Donas da História, de curadoria de Izis Abreu e Clarissa Lima. A mostra teve como objetivo contar a trajetória de 16 mulheres negras gaúchas, de várias idades, diversas regiões do estado e múltiplas vivências, oito delas in memoriam. Na entrada da presente exposição, como uma homenagem às que vieram antes e guiam as novas gerações, trouxemos as anciãs fotografadas em Donas da História.


Neste mesmo sentido, homenageamos também a mestra Griô Sirley Amaro (1936 - 2020), que aprendeu o ofício de costureira desde menina e ficou conhecida nacionalmente por seus “fuxicos”, por suas bonecas confeccionadas com restos de panos e pelas inúmeras oficinas que ministrou.


A pelotense recebeu o Prêmio Culturas Populares, em 2013, e o título de Doutora Honoris Causa da Universidade Federal de Pelotas, em 2019, sendo a primeira mulher negra a recebê-lo. Que Sirley siga em nossas memórias tocando seu tambor de Sopapo.

Mestra Popular Incubadora Cultura Viva - Sirley Amaro

VESTIDA DE LUTA

​Mais do que uma declaração da moda em si e de nossa autoexpressão, o vestir é uma declaração política que se manifesta em tecidos, cores, matérias-primas, caimento e tecnologias empregadas. Os Panteras Negras na década de 1960, por exemplo, subverteram o uniforme militar usando casacos e boinas de couro como símbolos de poder da população negra norte-americana.


Com relação às maneiras de exteriorizar e manifestar violências e lutas de forma explícita, destacam-se as camisetas com frases, símbolos e palavras de ordem. Usadas inicialmente como roupa íntima, nos anos 1960 esse tipo de peça se popularizou como uma roupa do cotidiano, e é nessa época que vemos as primeiras referências de camisetas sendo usadas como método de protesto. Momento importante para a consolidação desta prática se deu no contexto do Movimento Punk, que ocorreu entre as décadas de 1970 e 1980. A pesquisadora Diana Crane argumenta que a camiseta assumiu a função de passar mensagens que, antigamente, era atribuída aos chapéus: enquanto estes sinalizavam o status social, aquela passou a expressar ideias coletivas de reivindicação.

HISTÓRIAS DO VESTIR

PRESENÇA NO BRINCAR

Por meio do brincar, a criança experimenta o mundo, manifesta anseios e medos, melhora a capacidade de socialização, lida com suas emoções, aprende e se desenvolve.


A existência de bonecas e bonecos negros é importante para que as crianças aprendam sobre diversidade e diferença e, em especial para as crianças negras, para o fortalecimento da sua autoestima.
 

Entre as décadas de 1960 e 1980, diversas marcas de brinquedos começaram a produzir as primeiras bonecas negras, as quais chegaram muito timidamente no Brasil. Também na década de 1980, a partir das mãos da artista e artesã Lena Martins, natural de São Luís do Maranhão, nasceram as bonecas Abayomi, feitas de tecido preto, sem costura e sem cola (alguns atribuem a criação destas bonecas às mulheres escravizadas nos navios negreiros). No ano 2000, em São Paulo, é aberta a primeira loja de bonecas negras do Brasil pelas irmãs Venancio – Lúcia, Joyce e Maria Cristina. Hoje, ainda que em uma porcentagem muito pequena, são mais facilmente encontradas bonecas negras em lojas físicas e virtuais.


Porém, para além de serem objetos de comercialização, as bonecas negras são formas de promover a educação antirracista. Neste contexto, uma importante ação surgiu no Rio Grande do Sul, as professoras Franquilina Cardoso, fundadora do Grupo Multiétnico de Empreendedores Sociais e Maria Marques, primeira mulher negra a receber a Medalha Negrinho do Pastoreio, desenvolveram o Projeto Bonecas Negras Referencial de Beleza e Valorização das Origens. Criado no ano de 2003, o projeto viaja pelas escolas do estado com o objetivo de levar representatividade ao público escolar, promovendo a educação inclusiva.

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Franquilina Cardoso
Acervo pessoal/ Editada em P&B pelo MHJC

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Maria Marques
Acervo pessoal/ Editada em P&B pelo MHJC

NAS RAÍZES DO SAMBA

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Tia Ciata
Foto: Wikimedia Commons

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Clementina de Jesus
Foto: Wikimedia Commons

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​A presença das mulheres negras no samba não é novidade. Para além das passistas, rainhas, princesas, madrinhas de bateria, porta-bandeiras, as mulheres negras foram fundamentais para a existência do samba, este ritmo brasileiro de raízes africanas.

No Rio de Janeiro, um dos berços do samba nacional, destaca-se a figura da baiana Tia Ciata, que se mudou para a referida cidade quando adulta. Nas primeiras décadas do século XX, abriu as portas da sua casa para compositores e cantores. Foi ali onde se reuniram Pixinguinha, os primeiros sambistas da Portela e muitos outros sambistas populares, como Donga e Mauro de Almeida, autores do primeiro grande samba de sucesso, “Pelo telefone”,composto na casa de Tia Ciata.

As mulheres negras também estão presentes no samba como compositoras, cantoras e intérpretes, podendo ser citadas Jovelina Pérola Negra, Clementina de Jesus, Dona Ivone Lara, Leci Brandão, Teresa Cristina, Alcione, Mart’nália, e tantas outras.

 

As mulheres negras gaúchas não ficam de fora dessa história: trazemos os exemplos de Alexsandra Amaral e Sharlisa Rodrigues Borges.

Vinda de uma família de músicos e carnavalescos, a musicista Alexsandra Amaral foi a primeira mulher a reger a bateria de uma escola de samba no Brasil, no ano de 2001. Mestra Alê, como é conhecida, é professora de música de adultos e crianças.

Sharlisa Rodrigues Borges, junto de três amigas, idealizou a primeira roda de samba de Mulheres de Porto Alegre, no ano de 2021, com o objetivo de proporcionar um espaço para que qualquer mulher da cidade possa tocar seus instrumentos, cantar e fazer samba.

DESBRAVANDO TERRITÓRIOS

As mulheres negras gaúchas são pioneiras nas mais diversas áreas, das artes às ciências. Trazemos aqui alguns destes exemplos.


No ano de 2013, Jaqueline Trindade Pereira, a Rapper Negra Jaque, foi a primeira mulher vencedora da “Batalha do Mercado”, conhecido evento de hip-hop da região metropolitana de Porto Alegre. Jaque é a liderança à frente do centro cultural “Galpão Cultural Casa de Hip-Hop”, no Morro da Cruz, em Porto Alegre.


No ano de 2016, Giane Vargas, Fernanda Oliveira e Nina Fola criaram o Atinúké - Grupo de Estudos sobre o Pensamento de Mulheres Negras. Traduzido do idioma Iorubá, Atinúké significa “aquela que merece carinho desde a gestação”. O grupo hoje agrega mulheres negras de todo país.


Vencedora do Prêmio Açorianos de Música pelo conjunto de sua obra, no ano de 2019, a locutora, compositora e produtora cultural Loma Pereira é protagonista em sua área, tendo conseguido destaque na música tradicionalista gaúcha, predominantemente masculina e branca.


Em 2019, a geógrafa Daniele Machado Vieira ganhou o XI Prêmio Brasileiro “Política e Planejamento Urbano Regional”, promovido pela Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional (Anpur), e recebeu menção honrosa no Prêmio Maurício de Almeida Abreu por sua dissertação “Territórios Negros em Porto Alegre (1800-1970): Geografia histórica da presença negra no espaço urbano”

Mapas retirados da dissertação de mestrado de Daniele Machado Vieira.

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NARRATIVAS DO FEMININO: o espaço expositivo

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